A nova era do tênis brasileiro
- Haroldo Zwetsch Júnior

- há 2 horas
- 6 min de leitura
por Haroldo Zwetsch Jr.
O tênis brasileiro vive um momento de renovação — não apenas dentro das quadras, mas na forma de pensar, ensinar e competir. Esta série reúne três reflexões sobre o novo ciclo que o país está atravessando: a inspiração que João Fonseca traz para a base, o processo de formar coragem e decisão no treino, e o cenário atual que coloca o Brasil novamente no centro do tênis sul-americano.

Uma Nova Mentalidade na Formação do Tênis Brasileiro
O exemplo de João Fonseca e o jogo de coragem que inspira uma geração
O João Fonseca representa mais do que um grande resultado. Ele simboliza uma nova mentalidade no tênis brasileiro — uma forma diferente de pensar, treinar e competir. Durante muito tempo, o nosso jogo foi mais sobre “esperar” do que sobre “fazer”. Jogadores formados para trocar bolas, evitar erros e deixar o ponto acontecer. João mostra o oposto: um jogo de coragem, iniciativa e decisão.
Ele traz o espírito da nova geração — agressiva, propositiva e inteligente. É o jogador que não espera o jogo vir até ele; ele vai até o jogo. E isso é fruto de um processo, não de acaso. Desde cedo, João foi educado a buscar a melhora constante, a se desafiar, a tentar o que foi treinado, mesmo sob pressão. Essa coragem vem de dentro, mas também é construída ao redor: pais que incentivam o risco, técnicos que estimulam a decisão, e um ambiente que valoriza o processo, não apenas o placar.
A formação moderna no tênis precisa seguir esse caminho. Precisamos formar jogadores que pensam e decidem, e não apenas executam. Treinar hoje não é repetir o gesto, é repetir a intenção. É preparar o cérebro para agir com clareza e o corpo para responder com confiança.
E tudo isso começa com uma mentalidade — a mesma que fez o João Fonseca chegar onde está: a de competir com coragem, jogar para ganhar e ter orgulho de errar tentando fazer o certo.
Quando um jovem entende que competir é uma extensão do treino, e não um teste de medo, o jogo muda completamente. E quando um país inteiro começa a acreditar que pode formar atletas com esse tipo de mentalidade — disciplinada, ousada e propositiva —, o tênis deixa de ser um sonho isolado e passa a ser um projeto coletivo.
O João Fonseca é o símbolo de uma geração que joga para frente, que acredita no próprio trabalho e que transforma cada ponto em aprendizado. Ele mostra que o tênis brasileiro tem sim futuro — se a gente tiver coragem de ensinar coragem.
Como Formar a Coragem e a Decisão no Treino
A mentalidade que separa quem treina para repetir de quem treina para evoluir
Quando falamos em formar jogadores, muita gente pensa primeiro em técnica. Mas, com o tempo, eu aprendi que a verdadeira base de um tenista não está no golpe, e sim na mentalidade de fazer, de tentar, de decidir. É ali que nasce a coragem.
Essa coragem não é algo que aparece do nada. Ela se constrói. E o primeiro passo é o treinador enxergar o processo com visão de longo prazo. O técnico precisa entender onde quer chegar com o atleta — e respeitar as etapas do caminho. Nem toda fase é brilhante. Nem todo treino termina em progresso visível. Mas é justamente nesses momentos, em que parece que nada anda, que o jogador está absorvendo o que mais importa: o entendimento do jogo.
Eu vejo muitos pais e técnicos confundindo o tempo da formação com o tempo da competição. A infância e a adolescência são fases de aprendizado, de construção, de acúmulo de repertório. Errar faz parte. O erro, nessa fase, é ferramenta — não falha. Só que o ambiente precisa estar preparado para isso. Se o treinador não tiver calma, se os pais não tiverem confiança, o atleta cresce com medo de errar. E um jogador com medo de errar nunca vai aprender a decidir.
A coragem vem do ambiente. Quando o jogador entende que pode tentar, que o treino serve para experimentar, que o técnico está junto — ele se solta. E quando ele se solta, ele começa a pensar o tênis, não apenas bater na bola. Esse é o ponto de virada. O atleta deixa de reagir e começa a criar.
Formar coragem no treino é ensinar o jogador a escolher, a assumir riscos, a acreditar no que treina. É treinar o olhar, o raciocínio, e não só o movimento. Porque a decisão certa não vem da mão — vem da cabeça. E quanto mais o jogador é exposto a situações onde precisa decidir, mais rápido ele aprende a confiar no próprio instinto.
Mas nada disso acontece sem paciência. Muitos jogadores têm fases “truncadas”, onde o resultado parece travar. Só que o processo está funcionando. É o momento em que o cérebro está organizando tudo o que aprendeu. Depois, de repente, o jogo começa a fluir, e tudo o que parecia parado ganha sentido.
Por isso, o tempo da formação precisa ser respeitado. Cada atleta tem seu ritmo de absorção, seu tempo de maturação. E o papel do treinador é guiar esse processo sem pular etapas. A família, por outro lado, precisa entender que o que se planta hoje só vai florescer mais à frente. E que o jogador que erra muito aos 10 pode ser o mesmo que acerta tudo aos 18 — se for bem acompanhado.
O Brasil tem uma tendência de buscar o plano B quando o plano A dá trabalho. Mas, na formação de tenistas, o plano A é o único que funciona: trabalhar certo, com método, paciência e consistência. Não há atalhos. O jogador que aprende a acreditar no processo desenvolve uma força que vai além do esporte — a força de confiar no que se constrói todos os dias.
Essa é a verdadeira coragem: fazer o que é certo mesmo quando ainda não dá resultado. E é isso que forma não só o atleta, mas o competidor de verdade.
O Novo Momento do Tênis Brasileiro
Um país que voltou a acreditar no plano A
O tênis brasileiro está vivendo um momento especial. Depois de muitos anos buscando caminhos, o Brasil voltou a ser o grande celeiro da América do Sul. Os principais torneios juvenis do continente hoje acontecem aqui. Competições que dão convites para Grand Slams são realizadas em solo brasileiro. Temos uma base forte, um calendário robusto e uma geração de jovens jogadores que está voltando a inspirar o país.
Esse movimento não é por acaso. Ele é resultado de um esforço coletivo — de federações, clubes, treinadores e famílias — para reconstruir a cultura de formação. A CBT vem fazendo um trabalho importante nesse sentido: programas de capacitação, mentorias para técnicos, eventos profissionais e juvenis cada vez mais organizados. O ambiente voltou a respirar tênis. E quando o ambiente é bom, o talento aparece.
A ascensão do João Fonseca simboliza muito disso. Ele é o rosto mais visível dessa nova era, mas não está sozinho. A Nauhany Silva — a Naná — é outro grande exemplo. Com apenas 15 anos, já venceu seu primeiro torneio profissional e é a segunda melhor jogadora do mundo na idade dela, no ranking da WTA. Ela mostra que o sonho é real, que é possível competir de igual para igual com as melhores. E isso inspira uma geração inteira.
Ver jovens brasileiros conquistando resultados internacionais desperta algo que estava adormecido: a ambição. Os jogadores olham para o lado e percebem que gente da mesma idade, treinando no mesmo país, está chegando lá. Isso cria um efeito em cadeia. Acreditar começa a virar hábito.
E não são só os jovens. A Bia Haddad continua sendo uma referência de consistência, profissionalismo e exemplo dentro e fora da quadra. Luisa Stefani mantém o Brasil no topo das duplas mundiais, mostrando que também é possível ser elite nessa especialidade. Essas figuras fortalecem o imaginário coletivo do tênis nacional — e passam uma mensagem muito clara: é possível viver do tênis no Brasil.
Durante muito tempo, o plano A parecia distante. Formar atletas, competir em alto nível e viver do esporte pareciam sonhos reservados a poucos. Mas hoje, o cenário é outro. O plano A está de volta. E o plano A é o certo: formar, acreditar, trabalhar e construir. O tênis brasileiro está entendendo que não precisa mais de um plano B. Precisamos apenas seguir acreditando no processo — e continuar fazendo o que está dando certo.
Os próximos anos prometem ser grandes. Há projetos sólidos sendo criados, clubes investindo, técnicos se capacitando, federações dando suporte e atletas acreditando cada vez mais cedo. O país inteiro começa a entender que o tênis pode, sim, ser uma carreira, uma profissão e um propósito de vida.
Estamos voltando a jogar o jogo certo — o jogo de quem acredita. E quando um país inteiro acredita, o resultado é só questão de tempo.
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